A memória de um povo é o registro do passado, em interação permanente com o seu presente, formando ligações conceituais e afetivas, em ação contínua de firmamento de sua identidade, que modelará o seu futuro. A isso se chama de identidade cultural. No último domingo, o editorial deste nosso diário fala da redenção do Palácio Arquiepiscopal, com o empenho da arquidiocese de Salvador em recuperar o que se encontra abandonado. Coincidentemente, no sábado, fui conhecer de perto a Igreja e o Convento de Santo Antônio, no São Francisco do Paraguaçu, em Cachoeira, à margem do baía do Iguape, no rio Paraguaçu. Uma construção de 1686, que, em ruínas, as suas paredes externas resistem bravamente ao abandono.
Apenas como registro do nosso desinteresse geral coma nossa história, comentei com amigos, na mesma noite, o que vi e me entristeceu. Constatei, no entanto, que pessoa alguma sabia da existência de tal relíquia ou tinha ouvido falar, muito menos que estivesse em ruínas. O mesmo tinha acontecido comigo, o que me fez conhecê-lo. E você, caro leitor, honestamente, o conhece ou já ouviu falar? Pois é, em tudo isso vemos a nossa falta de comprometimento com o futuro, quando desprezamos, ou pior, destruímos o nosso passado.
A preservação de ícones, de símbolos da nossa história não deve servir apenas como justificativa na possibilidade turística, isto é reduzir a caminhada de um povo à necessidade de fotos para outros. Esse descaso evidencia em si uma falta de vinculação, de pertencimento a uma Nação, justificando, também, por este viés, uma falta de comprometimento com toda a estrutura de sua origem. O resultado, então, de tudo isso se revela no que vemos pelas nossas ruas: desde o lixo que se joga pela janela dos carros, o vandalismo dos bens públicos, até na falta de civilidade dos dias atuais. É esse todo o legado que estamos deixando para filhos e netos – um país sem referências, funcionando como pauta de reunião de condomínio, com o que ocorrer.